Relatório sobre intolerância religiosa aponta uma média de 3 casos de intolerância por dia no Brasil
- Dine Estela
- 21 de jan. de 2023
- 5 min de leitura

O II Relatório sobre Intolerância Religiosa: Brasil, América Latina e Caribe, lançado na Semana Nacional de Combate à intolerância religiosa no Brasil, apresenta uma média de 3 casos de intolerância registrados por dia em 2022. A publicação foi organizada pelo Centro de Articulação das Populações Marginalizadas (CEAP) e pelo Observatório de Liberdades Religiosas (OLIR), conta com o apoio da Representação da UNESCO no Brasil.
No que tange à América Latina e Caribe, o relatório se baseia num esforço conjunto de sintetizar as informações obtidas no âmbito do projeto "Acredite no Plural", desenvolvido em conjunto entre Otros Cruces e a Rede Latino-Americana e do Caribe pela Democracia (REDLAD) entre 2021 e 2022.
Este relatório, assim como uma proposta de ação conjunta de combate á intolerância religiosa no Brasil foi entregue nas mãos da Ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, nesta quinta, 19, durante evento da Semana Nacional de Combate à Intolerância Religiosa promovida pelo CEAP e CECIR. O evento foi realizado no CCJF no centro do Rio.
Ao entregar o documento nas mãos da ministra Anielle Franco, o interlocutor e coordenador da pesquisa, o professor doutor, Babalaô Ivanir dos Santos, destacou a importância de ações conjuntas para combater a intolerância religiosa. “Não vamos largar sua mão, ministra. Estamos juntos nesta luta e sabemos como contribuir. Pode contar conosco. Você não está sozinha e como acredito na ancestralidade, sei que sua irmã, Marielle Franco também está com você nesta jornada”, destacou se referindo à irmã da ministra, a vereadora Mariele Franco assassinada no Rio de Janeiro há cinco anos.

A ministra retribuiu o carinho destacando que fará um ministério da “escuta”. “Estarei sempre com telefone à sua disposição, pode me ligar sempre que precisar, o senhor e todos que precisarem. Esta é uma luta de todos nós”, destacou a ministra Anielle Franco. A ministra adiantou que já programou uma secretaria especial para cuidar dos casos de intolerância religiosa em seu ministério. “Estamos transformando uma secretaria em ministério, muita coisa ainda será feita, mas vamos avançar”, destacou.
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Foram coletados subsídios e estatísticas do Disque 100 do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (MMFDH), do ISP (Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro) e da Secretaria Estadual de Direitos Humanos da cidade do Rio de Janeiro. Somados a isso, foram reunidos os casos levantados pela Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), denúncias veiculadas na imprensa nacional e dados apresentados pela comunidade indígena, muçulmana e pela comunidade judaica em nível nacional.
O relatório inova ao apresentar as denúncias de intolerância contra os povos indígenas e um panorama da América Latina e Caribe através do trabalho em conjunto com "Acredite no Plural", Otros Cruces e a Rede Latino-Americana e do Caribe pela Democracia (REDLAD) entre 2021 e 2022.
A primeira parte é dedicada à apresentação das fontes e dos dados quantitativos extraídos das fontes; e a segunda seção apresenta artigos escritos por pesquisadoras e pesquisadores que vêm, ao longo dos anos, se debruçando sobre o tema.
Com esse levantamento é possível perceber que dos 56% dos casos em que é possível identificar a religião do violador de direitos esta é evangélica. A maior ocorrência (23,8%) é de vizinhos intolerantes. Porém, é importante sinalizar que 19,5% são de figuras públicas e 13% de ministros religiosos que tem um poder de irradiação maior. No geral, se vê que o intolerante se manifesta em vários espaços da sociedade. A ocorrência de 10% de casos de Terreiros ameaçados ou expulsos pelo tráfico é subestimada, pois todos que tivemos contato, falam sempre de outros Terreiros que também sofreram do mesmo crime.
Segundo os dados recolhidos pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) através do Disque 100, foram totalizados 477 casos de intolerância religiosa no ano de 2019, 353 casos no ano de 2020 e 966 casos no ano de 2021. Observa-se que o ano de 2020 apresentou o menor número total de casos de intolerância religiosa entre os anos analisados neste relatório. Como hipótese para esta diminuição de casos, ressalta-se no relatório, que o ano de 2020 foi marcado pela consolidação da pandemia da COVID-19, fato que impôs uma série de medidas restritivas de circulação e sociabilidade que podem ter contribuído para um menor número de casos de intolerância religiosa neste período.
Dos 477 casos registrados para o ano de 2019, o Estado de São Paulo foi o que apresentou o maior registro, totalizando 117 casos. Em seguida, o Estado do Rio de Janeiro aparece com 77 casos, o Estado de Minas Gerais com 46 casos, demonstrando a proeminência dos estados da Região Sudeste nas denúncias do dique 100.
No ano de 2020 segundo os dados do Ministério da Mulher da Família e dos Direitos Humanos (disque 100) o Brasil teve um total de 353 casos de intolerância religiosa, distribuídos entre as seguintes religiões: não-definido 103 casos, matriz africana 86 casos, matriz evangélica 63 casos, demais religiões 55 casos, católica 34 casos e sem religião 12 casos.
No ano de 2021 segundo os dados do Ministério da Mulher da Família e dos Direitos Humanos (disque 100) o Brasil teve um total de 966 casos de intolerância religiosa distribuídos entre: matriz africana 244 casos, não-definida 234 casos, matriz evangélica 186 casos, demais religiões 160 casos, católica 125 casos e sem religião 17 casos.
No ano de 2020 o estado do Paraná teve um total de 17 casos, distribuídos nas seguintes religiões: não definida 7 casos, matriz africana 3 casos, matriz evangélica 3 casos, católica 3 casos e budismo 1 caso.
Outro destaque deste relatório mais abrangente, está nos registros de ataques contra comunidades indígenas. O II Relatório de intolerância religiosa, racismo religioso registra ataques a casas de rezas incendiadas em comunidades Kaiowá e Guarani em Dourados-MS, março de 2022.
O levantamento de dados do relatório é feito por uma equipe de antropólogos que realizaram trabalhos de campo nas aldeias. A partir dos levantamentos de campo foram encontrados diversos relatos e indícios de crime de intolerância, como queima das casas de rezas (oga pysy), agressões, ameaças, torturas, tentativas de homicídio contra nhanderu (rezadores) e feminicídio contra as nhandesy (rezadoras).
O relatório aponta que os possíveis responsáveis destes atos são membros de igrejas pentecostais em destaque a Igreja Deus é Amor. Além da busca dos relatos de intolerância religiosa, foi feito um levantamento de evidências via registro audiovisual, produção de relatórios, acompanhamento jurídico, antropológico e psicossocial e encaminhamentos das incumbências para as autoridades competentes dar sequência à resolução dos fatos ocorridos.
De novembro de 2020 a fevereiro de 2021, durante a produção do Mapa da Violência em campo, foi registrado 21 casos de diversas, violências contra mulheres rezadeiras, nhandesy. No ano de 2021, Kuñangue Aty Guasu acompanhou seis casas de rezas que foram queimadas.
O II relatório ainda questiona a falta de informações sobre agressões às populações LGBTQIA+, além da falta de informações básicas como Cor ou gênero não aparecem nestes dados. O apagamento destas informações pode representar um indicativo de invisibilidade no ano de 2019, ano da gestão da ministra Damares Alves, no governo Bolsonaro.
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