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Série: ESCRITOS HISTÓRICOS: A história de Baixo para cima

  • Foto do escritor: Dine Estela
    Dine Estela
  • 23 de ago. de 2021
  • 5 min de leitura

A história vista de baixo para cima é uma análise do historiador africano, Eric Hobsbawm (197-2012), Alexandria (Egito). Nessa época, tanto a Áustria quanto a Alemanha sofriam com a crise econômica e a convulsão social, consequências diretas da Primeira Guerra Mundial. Aos 16 anos já militava no movimento da juventude comunista da Alemanha.


Este ensaio foi escrito originalmente como contribuição à Festschrift de 1985, em homenagem a seu amigo, companheiro e colaborador, o falecido George Rudé. Foi publicado em Frederick Krantz (ed.), History from Below: Studies in Popular Protest and Popular Ideology [A história a partir de baixo: estudos sobre protesto popular e ideologia popular] (Oxford, 1988), pp. 13-28. O texto foi apresentado inicialmente na forma de conferência na Universidade Concórdia, Montreal, onde Rudé lecionava.


Em sua análise sobre a história vista de baixo para cima, Hobsbawm vai indagar o porquê se deu pouca importância histórica à classes populares ou sem poder econômico e sua influência para o desenvolvimento da humanidade, o que fica muito claro nos livros tradicionais de história que exaltam grandes líderes e heróis históricos em detrimento da grande contribuição das classes sociais menos favorecidas na evolução do processo histórico, como destaca o autor:


[...] gostaria de indagar por que a história dos movimentos populares é uma moda tão recente — ou seja, por que a maioria da história escrita por cronistas contemporâneos e estudiosos subsequentes desde o início da escrita até, digamos, o fim do século XIX, nos diz tão pouco sobre a grande maioria dos habitantes dos países ou Estados que ela esteve registrando, por que a pergunta de Brecht “Quem construiu a Tebas dos Sete Portões?” é típica do século XX? A resposta nos leva tanto para a natureza da política — que até recentemente era o tema característico da história — quanto para as motivações dos historiadores. (Hobsbawm,1985).


A grande massa, que envolve várias classes trabalhadoras e sociais, desvalorizadas pelos historiadores, é a verdadeira mola propulsora do desenvolvimento histórico. No entanto, mesmo a revolução francesa, que foi um levante de movimentos populares, também foi um ponto singular entre os relatos históricos, até porque os arquivos deste movimento, geraram muita documentação preservada, ao contrário do que aconteceu nos outros levantes dos movimentos populares que ficaram à mercê dos relatos orais e indícios históricos que somente foram valorizados a partir da Escola dos Analles.



A importância da história oral

Mesmo que as pessoas comuns não apresentem tantos arquivos prontos para serem analisados, o autor vai destacar a metodologias da oralidade histórica para descortinar estas possibilidades, alertando para os perigos do anacronismo, além, do juízo de valor de cada situação. Mas Hobsbawn enfoca que estudar esses movimentos sociais é fundamental para descobrir o cerne das mudanças da sociedade. “Para os marxistas, ou para os socialistas em geral, o interesse pela história dos movimentos populares se desenvolveu com o crescimento do movimento operário``. destaca Hobs.


Muitas vezes não serão encontrados documentos prontos para serem analisados, mas uma rica história a ser contada nas entrelinhas dos indícios históricos encobertos nos costumes populares como: comidas, bebidas, cultos, entre outras tradições passadas de geração para geração e que colaboram com os estudos sobre estas pessoas ditas “comuns”. No entanto, o autor destaca que este é um meio escorregadio de se preservar os fatos. Como diz o ditado popular. - Quem conta um conto, aumenta um ponto.


O conselho do historiador é o de cruzar informações para tentar chegar o mais próximo possível da “verdade histórica”, mas este campo acaba sendo um processo muito intuitivo e muitas vezes presente numa “História marginal”, como observa a professora e historiadora, Mariana Gino (PPHC/UFRJ). “O movimento de recolocar todas estas questões como algo a ser questionado, vem sendo feito pelos intelectuais africanos e pelos asiáticos e eles têm como principal eixo: a história contada pelo colonizado e não mais pelo colonizador, se opondo à história oficial”, observa. “Lembrando que a história não tem uma versão, ela tem várias versões” e todas podem ser verdadeiras, sob cada ponto de vista”, acrescentou.


Amadou Hampâté Bâ vai dizer que tudo que está escrito, primeiro foi dito, logo, reflete um acontecimento oralizado que foi eternizado pela escrita, que pode ou não ser um relato fidedigno da realidade.


]...] Não faz a oralidade nascer a escrita, tanto no decorrer dos séculos como no próprio indivíduo? Os primeiros arquivos ou bibliotecas do mundo foram o cérebro dos homens. Antes de colocar seus pensamentos no papel, o escritor ou o estudioso mantém um diálogo secreto consigo mesmo [...]. (Hampâté Bâ. 2010. P. 168.)

Enquanto para os ocidentais, a palavra vem perdendo cada vez mais credibilidade, para a tradição oral africana, ela é questão de honra. A fala tem o poder de encantar os deuses e torna-se sagrada. Logo, não cumprir uma fala, significa uma verdadeira morte moral, como destaca Hampâté Bâ. O autor destaca um dos poemas rituais de Komo Dibi de Kulikoro, no Mali para reforçar essa noção de poder da fala:


“A fala é divinamente exata,

convém ser exato para com ela”.

“A língua que falsifica a palavra

vicia o sangue daquele que mente.”


Este trecho do verso revela o quão a força da palavra mal dita ou falsa para a cultura tradicional africana pode envenenar a alma humana. Destacando que ao pensar algo e dizer outra coisa, se está envenenando a palavra e viciando o sangue. Este respeito com a palavra garante para os africanos o respeito pelos mestres que transmitem através da palavra os conhecimentos herdados pelos ancestrais ou através de pessoas idosas como bem lembra o autor no capítulo 8 (Tradição Viva) da “História geral da África”. Estes são os chamados tradicionalistas, os grandes depositários da herança oral. Ou seja, um mentiroso nunca poderia ser um “mestre da faca” e muito menos um Doma.


Estes mestres (Doma) como são chamados em algumas regiões, passam seus conhecimentos de ramos específicos que podem ser de ferreiro, tecelão, caçador, pescador, tudo através da oralidade. Hampâté Bâ lembra, no entanto, que nem todo Doma é um especialista em algo, ele também pode ser um generalizador de conhecimentos. Todos conhecimentos empíricos, vale destacar. Logo, estes conhecimentos passados através da oralidade não se restringiam somente aos griot.


Algo que não ficou claro neste capítulo do livro foi a preocupação do autor com a morte de alguns mestres que levariam com eles todo o seu conhecimento. Ora, se este conhecimento vem sendo passado para as pessoas há várias gerações, por quê razão eles morreriam exatamente com os últimos grandes Domas e anciãos, herdeiros dos vários ramos da Tradição.

Reconstruir processos históricos, a partir de fontes orais, é como montar um quebra-cabeças, como analisa Hobsbawm. Ou seja, é preciso não somente colecionar estas informações, mas encaixá-las de maneira a fazer sentido histórico, mesmo que não siga um método cartesiano. E neste sentido, o método das hipóteses poderá ajudar muito, visto que, através delas abre-se um caminho do axioma, das informações básicas que podem tornar-se um fio condutor desta historiografia com base em informações coerentes.


A história oficial de construção do Brasil foi contada pelo ponto de vista e para o ponto de vista dos grandes políticos, líderes sociais e abastados, mas quem construiu de fato a história deste país foram os colonizados, os negros, os operários, as classes trabalhadoras e subalternas que formam a grande massa. Essa é a história vista de baixo para cima destacada por Hobsbawm.


Notas de rodapé

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¹ A Escola dos Annales foi um movimento historiográfico surgido na França, durante a primeira metade do século XX. O novo movimento historiográfico foi muito impactante e inovador, colocando em questionamento a historiografia tradicional e apresentando novos e ricos elementos para o conhecimento das sociedades.

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² O método cartesiano é baseado na dedução pura, consiste em começar com verdades ou axiomas simples e evidentes por si mesmos, e depois raciocinar com bases nele, até chegar a conclusões particulares. Fonte: https://www.significados.com.br/cartesiano/












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