MPF pede julgamento antecipado de ação para suspender decreto sobre posse de armas na Baixada Flumin
- Minha Baixada
- 3 de jun. de 2019
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Em manifestação enviada na última sexta (31) à Justiça Federal de Nova Iguaçu, o Ministério Público Federal (MPF) requereu o julgamento antecipado de mérito da ação civil pública que trata das ilegalidades contidas no Decreto nº 9.685/2019, que trata dos requisitos para a concessão de registro de posse de arma de fogo. Segundo o órgão, o processo está pronto para julgamento, e as ilegalidades não foram refutadas pela União em sua peça de defesa.
A principal discussão reside no estabelecimento da presunção de “efetiva necessidade” para a autorização do registro de posse de arma. Segundo o MPF, por meio do procurador da República Julio José Araujo Junior, responsável pela ação, a legislação prevê a declaração de efetiva necessidade de arma de fogo, em conjunto com os demais requisitos legalmente previstos, que devem ser analisados de maneira prévia, específica, pessoal e individualizada para a concessão de Craf. Já o novo decreto toma como base o simples aspecto geográfico (área rural ou área urbana em unidade federativa com índice anual de mais de dez homicídios por 100 mil) ou profissional (titulares ou responsáveis por estabelecimentos comerciais e industriais), sem estabelecer critérios estritos para a aferição da efetiva necessidade da arma de fogo.
A União alegou em contestação que o decreto teria estabelecido parâmetros claros, mediante a a adoção de um “modelo de política pública” em que foram estabelecidas hipóteses se considerará presente o requisito necessidade. Para o MPF, esse argumento é frágil, uma vez que o tema em questão está relacionado ao tratamento do poder de polícia e à ação fiscalizatória do Estado. Ainda que fosse uma política pública, não há qualquer diretriz ou estabelecimento de desenho institucional sobre o assunto. Por fim, o órgão relembra declarações do próprio Ministro da Justiça e Segurança Pública, que reconheceu que o decreto não se refere a uma política de segurança.
O MPF destaca ainda que a imediata suspensão dos efeitos do decreto é uma medida fundamental para inibir a lesividade causada pela proliferação de armas de fogo. A peça ressalta que a União admitiu que havia antes um alto número de indeferimentos de pedidos de registro, os quais, nos termos do atual decreto, seriam autorizados. “A União vale-se de ideias como 'presunção' e 'boa-fé' para sustentar a defesa da flexibilização contida no decreto, chancelando a abdicação do poder de fiscalizar do Estado, em orientação contrária à do Estatuto do Desarmamento”, afirma o procurador.
Histórico do caso – O MPF ajuizou em março deste ano ação civil pública na 2ª vara federal de Nova Iguaçu para que a Justiça determine à Polícia Federal suspenda os processos de análise e concessão de novos Certificados de Registro de Armas de Fogo (Craf) na Baixada Fluminense, ou não aplique as novas regras previstas no Decreto nº 9.685/2019. Para o órgão, o decreto é ilegal, ao contrariar o Estatuto do Desarmamento (lei 10.826/2003), generalizando o requisito de comprovação de efetiva necessidade para a aquisição de armas de fogo por pessoas físicas.
A demanda, que foi precedida de representação da entidade Fórum Grita Baixada, o MPF alega que o Decreto nº 9.685/2019, sob o pretexto de regulamentar o Estatuto do Desarmamento (lei 10.826/2003) e rever o decreto anterior (nº 5.123/2004), contrariou os termos da lei, alterando as suas premissas e avançando sobre competência do Poder Legislativo, em afronta à separação de poderes.
A ação do MPF destaca ainda que, conforme apontado pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), o decreto não atende ao objetivo alegado de conferir maior segurança à população. O número de homicídios por arma de fogo passou de 6.104, em 1980, para 42.291, em 2014, o que demonstra que armas de fogo continuam sendo usadas em grande quantidade, causando maior violência e insegurança, e não o contrário.
Além disso, 94,4% das vítimas de homicídio por arma de fogo são do sexo masculino e 71,5% das pessoas assassinadas a cada ano no país são pretas ou pardas. O documento aponta ainda que a maioria é jovem, entre 15 e 29 anos. Especificamente na Baixada Fluminense, de acordo com o Fórum Grita Baixada, houve 2142 casos de letalidade violenta em 2018, ou seja, 56 mortas a cada 100 mil habitantes, sendo 71,2% causadas por homicídio. O maior índice é o de Japeri (102,92), seguido por Itaguaí (93,72), Queimados (83,74), Belford Roxo (62,72) e Nova Iguaçu (59,47). O perfil das vítimas é de jovens (até 24 anos), geralmente pretos e pardos, do sexo masculino, com baixa escolaridade.
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